Agentes de Inteligência Artificial – Uma visão da evolução do conceito

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A inteligência artificial (IA) é uma das áreas mais transformadoras da ciência e da tecnologia no século XXI. Dentro desse campo, o conceito de agentes de IA tem desempenhado um papel central na modelagem de sistemas capazes de perceber, raciocinar e agir no mundo. Contudo, a definição do que é um “agente de IA” não permaneceu estática ao longo do tempo — ela evoluiu acompanhando os avanços tecnológicos, as mudanças de paradigma e a compreensão crescente sobre o que significa inteligência, tanto humana quanto artificial.

Este artigo apresenta uma linha do tempo que descreve a evolução das definições de agentes de IA desde os primórdios do campo até os dias atuais, destacando os principais marcos teóricos e tecnológicos.

1. Origens e Primeiras Reflexões (1950–1956)

O conceito de agentes inteligentes começou a ser discutido antes mesmo da formalização da IA como disciplina científica. Em 1950, Alan Turing publicou seu artigo “Computing Machinery and Intelligence”, onde propôs a famosa questão: “As máquinas podem pensar?” (Turing, 1950). Embora Turing não usasse explicitamente o termo “agente”, sua proposta do Teste de Turing já indicava a ideia de uma entidade capaz de interagir linguisticamente com humanos, simulando inteligência.

Em 1956, na Conferência de Dartmouth, a IA foi formalizada como um campo de pesquisa. A definição inicial era ampla e ambiciosa, sugerindo que “todo aspecto de aprendizagem ou qualquer outra característica da inteligência pode, em princípio, ser descrita de forma tão precisa que uma máquina pode ser construída para simulá-la” (McCarthy et al., 1956).

2. IA Simbólica e Manipulação de Símbolos (1960–1970)

Durante as décadas de 1960 e 1970, a IA foi dominada pelo paradigma simbólico, no qual a inteligência era vista como um processo de manipulação de símbolos e aplicação de regras explícitas (Nilsson, 2010). Os agentes eram concebidos como programas que operavam em ambientes bem definidos, baseados em lógica formal, sistemas de inferência e estruturas simbólicas.

Nesta fase, os sistemas eram essencialmente baseados em regras, seguindo instruções determinísticas para resolver problemas específicos, mas com pouca ou nenhuma capacidade de adaptação ao ambiente (Russell & Norvig, 2021).

3. Sistemas Especialistas e Tomada de Decisão (1970–1980)

Nos anos 1970, surgem os primeiros sistemas especialistas, como o MYCIN (para diagnóstico médico) e o DENDRAL (para análise química), que aplicavam conhecimento codificado para resolver problemas específicos (Nilsson, 2010). Estes sistemas já podem ser considerados agentes no sentido de que modelavam o conhecimento de especialistas humanos para tomar decisões em domínios específicos.

O conceito de agente passa, então, a incorporar a noção de um sistema que não apenas executa comandos, mas toma decisões com base em conhecimento pré-programado, reforçando a ideia de raciocínio simbólico estruturado.

4. Paradigmas Alternativos e Aprendizado (1980–1990)

Na década de 1980, a crise dos sistemas simbólicos — muitas vezes incapazes de lidar com ambientes incertos, incompletos ou ruidosos — levou à ascensão de abordagens conexionistas, como as redes neurais artificiais (Russell & Norvig, 2021). Neste contexto, surge a ideia de agentes que aprendem com dados, adaptando-se dinamicamente ao ambiente.

O conceito de agente adaptativo emerge, ampliando a definição além da simples execução de regras para incluir capacidades de percepção e aprendizagem contínua, algo que os sistemas especialistas da década anterior não eram capazes de realizar eficientemente (Nilsson, 2010).

5. Formalização do Conceito de Agente (1990–2000)

O conceito moderno de agente foi formalizado principalmente através dos trabalhos de Stuart Russell e Peter Norvig, no livro “Artificial Intelligence: A Modern Approach” (Russell & Norvig, 1995). Eles definem agente como:

“Qualquer coisa que percebe seu ambiente por meio de sensores e age sobre esse ambiente por meio de atuadores.” (Russell & Norvig, 1995, p. 33).

Essa definição generaliza desde sistemas simples, como termostatos, até robôs autônomos e sistemas complexos de IA. Além disso, os autores propõem uma tipologia de agentes:

  • Agentes simples reflexivos
  • Agentes baseados em modelos
  • Agentes baseados em objetivos
  • Agentes baseados em utilidade

Esse modelo consolidou-se como referência tanto na pesquisa quanto no ensino de IA.

Paralelamente, o campo de sistemas multiagentes também cresceu, trazendo a noção de agentes que interagem entre si, sejam eles cooperativos, competitivos ou neutros (Wooldridge, 2009).

6. Expansão com Aprendizado de Máquina (2000–2010)

Com o crescimento do aprendizado de máquina, especialmente técnicas supervisionadas e não supervisionadas, os agentes passam a ser definidos não apenas por sua capacidade de atuação, mas também por sua habilidade de aprender a partir de dados e melhorar seu desempenho ao longo do tempo (Russell & Norvig, 2021).

Os agentes agora incorporam modelos probabilísticos, algoritmos de otimização e técnicas estatísticas, permitindo uma atuação mais robusta em ambientes incertos, além de apresentar maior escalabilidade.

7. Agentes Inteligentes na Era do Deep Learning (2010–2020)

A partir de 2010, com o advento do deep learning, a capacidade dos agentes se expande drasticamente. Eles passam a integrar módulos de percepção avançada, como:

  • Visão computacional
  • Processamento de linguagem natural
  • Tomada de decisão complexa baseada em dados massivos (Bengio, LeCun & Hinton, 2015).

Sistemas como assistentes virtuais (Siri, Alexa, Google Assistant), veículos autônomos e robôs industriais inteligentes são exemplos claros desse avanço. Os agentes agora combinam sensores digitais, raciocínio e atuadores em ambientes tanto virtuais quanto físicos, com uma capacidade perceptiva e decisória muito mais ampla.

8. Agentes Generativos e Generalistas (2020–Presente)

Na década de 2020, a emergência dos modelos fundacionais, como GPT, Claude, Gemini e Llama, leva a um novo salto conceitual. Surge o conceito de:

  • Agentes generalistas, capazes de executar múltiplas tarefas em diferentes domínios com pouca ou nenhuma adaptação;
  • Agentes autônomos de IA generativa, capazes de criar textos, imagens, códigos e até tomar decisões complexas de forma autônoma (Bommasani et al., 2021).

Atualmente, a definição mais ampla de agente incorpora características como:

  • Percepção
  • Raciocínio
  • Ação
  • Aprendizado
  • Capacidade de colaboração com humanos e outros agentes
  • Autonomia na realização de tarefas complexas

De acordo com Bornet et al. (2024), um agente de inteligência artificial (Agentic AI) é uma entidade digital autônoma, orientada a objetivos, capaz de executar tarefas de múltiplos passos de maneira independente, sem depender de comandos constantes dos humanos. Diferente da IA generativa, que responde a comandos isolados, o agente funciona de forma proativa, planejando, tomando decisões, monitorando, ajustando suas ações e executando fluxos de trabalho completos.

Esses agentes são projetados para operar como colaboradores inteligentes, semelhantes a profissionais experientes, que não apenas realizam tarefas, mas também aprendem com interações anteriores, adaptam-se dinamicamente às mudanças no ambiente e mantêm memória persistente de contextos e processos.

Eles são capazes de integrar-se profundamente com APIs, bancos de dados e sistemas externos, o que lhes permite não só gerar informações, mas também agir efetivamente no mundo digital ou físico, promovendo automação de processos, aumento de produtividade e transformação nos negócios.

Além disso, a discussão contemporânea sobre agentes inclui preocupações éticas, riscos de alinhamento, segurança e governança de sistemas autônomos (Russell & Norvig, 2021; Bommasani et al., 2021).

Quadro Resumo – Definição de Agente de IA ao Longo dos Anos

PeríodoDefinição de Agente de IACaracterística PrincipalReferência
1950sMáquina que simula comportamento inteligente humano.Simulação de pensamento e comunicação (Teste de Turing).Turing (1950)
1956Máquina capaz de simular qualquer aspecto da inteligência humana.Enfoque amplo na simulação da inteligência geral.McCarthy et al. (1956)
1960–1970Sistema que manipula símbolos e executa regras lógicas para tomada de decisão.IA simbólica, agentes baseados em lógica e regras.Nilsson (2010)
1970–1980Sistemas que representam conhecimento humano para resolver problemas específicos (Sistemas Especialistas).Tomada de decisão baseada em conhecimento codificado.Nilsson (2010)
1980–1990Sistemas que, além de representar conhecimento, são capazes de aprender e se adaptar ao ambiente (IA conexionista).Agentes adaptativos, com aprendizado baseado em dados.Russell & Norvig (2021)
1995–2000“Qualquer coisa que percebe seu ambiente por meio de sensores e age sobre ele por meio de atuadores.”Formalização da definição moderna de agente.Russell & Norvig (1995)
2000–2010Agente como sistema autônomo que aprende e toma decisões baseadas em dados e estatísticas.Maior autonomia, uso de aprendizado de máquina e integração probabilística.Russell & Norvig (2021)
2010–2020Agente inteligente com módulos perceptivos (visão, linguagem), raciocínio e tomada de decisão complexa usando deep learning.Capacidade ampliada de percepção, decisão e atuação em ambientes físicos e digitais.Bengio et al. (2015)
2020–PresenteEntidade autônoma, capaz de planejar, tomar decisões, aprender, executar tarefas multietapas com memória persistente e integração com sistemas.Agentes generalistas, proativos, adaptáveis, autônomos, com alta integração e memória contextual.Bommasani et al. (2021); Bornet et al. (2024)
Definição de Agente de IA ao Longo dos Anos

Agentic AI

Agentic AI é um tipo de inteligência artificial projetada para atuar de forma semelhante a um profissional humano altamente qualificado, realizando tarefas complexas de maneira autônoma, organizada e adaptativa. Em vez de simplesmente gerar respostas a comandos isolados, como faz a IA generativa, um agente de IA executa processos de múltiplas etapas, tomando decisões ao longo do caminho, ajustando-se dinamicamente a condições e aprendendo com interações anteriores.

Assim como um agente de viagens humano, a Agentic AI não resolve um problema de uma só vez, mas segue um fluxo estruturado que inclui:

  • Pesquisar informações relevantes (ex.: destinos, preços, disponibilidade);
  • Verificar condições específicas (ex.: datas, restrições);
  • Criar planos preliminares;
  • Ajustar o plano conforme surgem obstáculos (ex.: hotel lotado ou voo caro);
  • Fazer reservas, executar ações e acompanhar detalhes como números de confirmação e políticas de cancelamento.

A Agentic AI possui memória persistente, capacidade de adaptação e tomada de decisão contínua, mantendo uma visão completa e atualizada do contexto para alcançar um objetivo final com o mínimo de intervenção humana.

AI Agent X Agentic AI

A evolução recente da inteligência artificial tem sido marcada pela emergência de dois conceitos centrais que, embora relacionados, apresentam distinções significativas tanto em termos conceituais quanto arquiteturais: AI Agents e Agentic AI. De acordo com Sapkota, Roumeliotis e Karkee (2025), a diferenciação entre esses dois paradigmas não é meramente terminológica, mas reflete transformações profundas na forma como os sistemas de IA são projetados, operam e interagem com ambientes digitais e físicos.

Os autores definem os AI Agents como sistemas autônomos orientados a tarefas específicas, cuja operação baseia-se na integração de modelos de linguagem de grande porte (LLMs) com ferramentas externas, APIs e módulos de raciocínio sequencial. Esses agentes são capazes de executar ciclos básicos de percepção, raciocínio e ação, permitindo a realização de atividades como atendimento ao cliente, recuperação de informações, agendamento de compromissos e geração de relatórios. No entanto, operam de maneira isolada, ou seja, não possuem mecanismos nativos de colaboração, coordenação ou comunicação com outros agentes. Sua autonomia é restrita ao contexto da tarefa para a qual foram programados ou configurados.

Por outro lado, o conceito de Agentic AI representa uma expansão substancial desse modelo. Enquanto os AI Agents são caracterizados por uma atuação individual, a Agentic AI se estrutura a partir de arquiteturas compostas por múltiplos agentes especializados, que interagem, compartilham memória, trocam informações e coordenam ações em busca de objetivos comuns. Como destacam Sapkota et al. (2025), a Agentic AI não apenas executa tarefas, mas é capaz de decompor problemas complexos em subtarefas, distribuir essas subtarefas entre agentes especializados e adaptar suas estratégias de execução de forma dinâmica, considerando mudanças no ambiente ou na própria definição dos objetivos.

Essa diferença também se reflete no grau de autonomia e na complexidade dos sistemas. Enquanto os AI Agents operam dentro de fluxos relativamente lineares e predefinidos — frequentemente dependentes de chamadas a ferramentas externas e limitados a um horizonte de planejamento curto —, os sistemas de Agentic AI são capazes de realizar planejamentos multietapas, promover raciocínio distribuído e tomar decisões em cenários de alta incerteza. Além disso, eles incorporam estruturas de memória persistente, capazes de armazenar estados, contextos e históricos de interação, o que permite aprendizado contínuo e adaptação a longo prazo.

Os autores ilustram essa distinção por meio de exemplos práticos. Um AI Agent típico pode ser um assistente de atendimento que responde perguntas sobre um pedido, consulta um banco de dados e informa o status ao cliente. Por sua vez, um sistema de Agentic AI seria capaz de, simultaneamente, analisar o contexto do cliente, consultar diferentes bases de dados, ajustar estratégias de resposta, escalar o atendimento para outros agentes especializados (como jurídico ou técnico), enquanto otimiza o fluxo de atendimento com base em parâmetros como prioridade, carga de trabalho e recursos disponíveis.

Os autores defendem que compreender essa diferenciação não é apenas relevante do ponto de vista acadêmico, mas também essencial para a prática de desenvolvimento de sistemas de IA. A definição adequada do paradigma — se AI Agent ou Agentic AI — impacta diretamente nas escolhas arquiteturais, nas métricas de avaliação, nos desafios associados (como escalabilidade, segurança e explicabilidade) e, sobretudo, no alinhamento entre as capacidades do sistema e a complexidade do problema a ser resolvido.

Portanto, a transição de AI Agents para Agentic AI não se trata apenas de um avanço incremental, mas de uma mudança paradigmática. Ela representa a passagem de sistemas orientados à automação de tarefas específicas para ecossistemas de inteligência colaborativa, distribuída e adaptativa, capazes de lidar com cenários cada vez mais complexos, dinâmicos e interdependentes.

Tabela Comparativa: IA Generativa vs. IA Agente

CaracterísticaIA GenerativaIA Agente (Agentic AI)
Capacidade PrincipalGeração de texto, imagens, código ou música com base em padrões aprendidosPlanejamento, tomada de decisão e execução de tarefas multietapas sem intervenção humana
Memória e ContextoMemória limitada (retenção de contexto no curto prazo, sem memória persistente)Memória persistente (lembra interações passadas e ajusta planos conforme necessário)
Nível de AutonomiaDepende de comandos humanos para gerar respostasOpera com mínima intervenção humana, executando fluxos de trabalho complexos
Integração com Sistemas ExternosIntegração mínima (usa APIs ou ferramentas externas apenas para funções pontuais)Alta integração (conecta-se com APIs, bancos de dados e até sistemas físicos)
Capacidade de AprendizadoEstática – aprende apenas através de re-treinamento manual pelos desenvolvedoresEvolutiva – aprende com interações, ajusta e refina seu comportamento continuamente
Casos de Uso TípicosCriação de conteúdo, sumarização, programação, assistência e brainstormingAutomatização de fluxos de trabalho, assistentes pessoais, operações de negócios, execução de processos complexos
Impacto nos NegóciosMelhora a eficiência em tarefas intensivas em conteúdo, mas não automatiza fluxos de trabalhoAutomatiza processos, reduz carga de trabalho humana e aumenta a escalabilidade dos negócios
– Aumento médio de velocidade: 25% mais rápido– Economia de tempo: 30% a 60%
– Melhoria média de qualidade: 40%– Aceleração de processos: 40% a 90% mais rápido
ExemplosChatGPT, Claude, Gemini, DALL·E, Midjourney, CopilotAutoGen, MS Copilot Agent Builder, UiPath Agent Builder, OpenAI Operator, Google Vertex, Crew.ai, Relevance.ai, Agentforce
IA Generativa vs. IA Agente

Conclusão

Como conclusão, é possível afirmar que a evolução dos agentes de inteligência artificial reflete o próprio amadurecimento da área de IA, que passou de simples modelos baseados em regras para sistemas sofisticados, capazes de aprender, se adaptar e tomar decisões de forma autônoma. A transição de agentes tradicionais, focados em tarefas isoladas, para os agentes generativos e, especialmente, para a Agentic AI, marca um salto significativo não apenas em termos tecnológicos, mas também na forma como interagimos e dependemos dessas soluções no cotidiano empresarial, científico e social.

Por fim, a diferenciação entre AI Agents e Agentic AI não representa apenas uma distinção técnica, mas sim uma mudança de paradigma que impacta diretamente a arquitetura dos sistemas, os modelos de negócio e as estratégias organizacionais.

Com agentes cada vez mais capazes de executar fluxos de trabalho complexos, colaborar entre si e operar de forma proativa, abre-se um novo horizonte de possibilidades e também de desafios relacionados à ética, segurança e governança desses sistemas. É essencial que empresas, pesquisadores e desenvolvedores compreendam essa transformação para aproveitar todo o potencial dessa tecnologia, mantendo-se atentos aos riscos e às responsabilidades que ela traz.